Sousa, Melo & Tapeocy Advogados

Licença maternidade de 180 dias para pai solo e o princípio do melhor interesse da criança

A licença maternidade concedida ao “pai solo”, portanto, não foi concedida no benefício do servidor. Ela foi deferida em razão e pelos interesses das crianças envolvidas.

Semana passada, o Supremo Tribunal Federal deu mais um passo na consolidação da licença-maternidade como instrumento de proteção da infância. O caso divulgado na imprensa envolveu um servidor público do INSS, pai de gêmeos concebidos por meio de procedimento in vitro e nascidos de uma barriga de aluguel nos Estados Unidos.

Como homem, a lei só garantia àquele “pai solo” a licença paternidade de 5 dias. Entretanto, tendo em vista o arranjo da nova família, em que não existe outro parceiro ou parceira que pudessem exercer os cuidados necessários às crianças recém-nascidas, a Suprema Corte entendeu que o benefício da licença maternidade, de 180 dias, deveria ser concedido ao pai, genitor monoparental.

O que a Corte levou em consideração, além do princípio da paternidade responsável, foi sobretudo o princípio do melhor interesse da criança, um princípio que, segundo alguns doutrinadores, teria origem no instituto do parens patrie do direito anglo-saxônico, no qual o Estado tomava para si a guarda dos interesses daqueles que fossem juridicamente limitados. Mas é um princípio, hoje, voltado não somente para o Estado, mas para toda a sociedade.

Basicamente, o que este princípio determina é que toda decisão que envolva a infância e adolescência, seja por parte dos governos, dos pais ou da comunidade, deve necessariamente levar o interesse dessa população como prioritário. Além da óbvia vulnerabilidade das crianças, o entendimento é que nelas está o futuro da nação. Se a presente geração não cuidar da próxima, nada restará num breve futuro.

A licença maternidade concedida ao “pai solo”, portanto, não foi concedida no benefício do servidor. Ela foi deferida em razão e pelos interesses das crianças envolvidas.

E a jurisprudência tem, a cada dia, evoluído nesse sentido, flexibilizando a conceção desses tipos de licenças, sempre priorizando o interesse da infância. Ano passado, a mesma Corte acabou por garantir a equiparação entre as licenças maternidades e da adotante. Há na lei do servidor público federal uma diferença de prazo dessas licenças, sendo menor o tempo concedido para a mãe que adota (apenas 90 dias), em comparação com a licença maternidade, de origem biológica. Entretanto, exatamente porque não pode haver discriminação entre a maternidade exercida em razão da gestação ou em razão da adoção, é que o STF considerou inconstitucional esse tratamento diferente, equiparando os prazos.

Questão mais controversa, que foi objeto de apreciação na 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, é aquela em que os dois pais ou mães pleiteiam a mesma licença. No caso concreto, um casal homoafetivo, formado por duas mães, pleiteou a concessão da licença maternidade de 180 dias para ambas, tanto para aquela que foi responsável pela gestação, quanto para aquela que forneceu o óvulo e, apesar de não ter sido a gestante, pretendia colaborar com a amamentação.

Nesse caso, porém, a Turma entendeu que o ordenamento jurídico dá o benefício do afastamento do trabalho, em razão do interesse da criança, a apenas um dos pais, não a ambos. Se o pleito fosse deferido em favor desse casal de mulheres, seria garantido um direito adicional que os demais casais não possuem. Neste caso, a isonomia seria quebrada.

Em casos assim, talvez tenhamos que evoluir e sermos mais parecidos com alguns países escandinavos, como Nuruega, Finlândia e Suécia, nos quais as licenças parentais são compartilhadas pelo casal e é este que decide quantos meses cada um se dedicará, de forma exclusiva, em favor da prole. Já há uma Proposta de Emenda Constitucional, de autoria da Senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM), nesse sentido.

O importante, em todos os casos, é que o interesse da infância seja efetivamente respeitado e os cuidados que devem ser dispensados, numa fase tão delicada da existência humana, sejam efetivamente exercidos pelos pais, independentemente do tipo de família que se tenha, seja formado por pais héteros, homoafetivos ou por famílias monoparentais.

Alberto Tapeocy, para Coluna “Direitos Fundamentais” da Rádio CBN Amazônia/Rio Branco, toda quinta, a partir das 7h.

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