Estamos no fim de mais um ano. 2022, o ano da tecnologia. Ano de Copa do Mundo. E, fugindo do texto do meme, ano também de eleições e muita coisa que aconteceu no mundo jurídico e político que comentamos aqui em nossa coluna.
Para fazermos uma breve retrospectiva, escolhi um tema principal de cada mês e, assim, termos uma noção de que um pequeno capítulo de nossa história foi escrito por cada de nós como sociedade brasileira.
Em janeiro, nosso ano começou quente com a discussão sobre uma ordem do Min. Alexandre de Moraes, do STF, que determinara o comparecimento obrigatório do Presidente Jair Bolsonaro a um depoimento em inquérito policial, no qual ele é investigado por vazamento de informações de informações sigilosas do TSE, durante uma de suas famosas lives. Acontece que o Alexandre de Moraes não poderia decidir daquela forma, pois, conforme entendimento do próprio STF, em caso envolvendo o presidente Lula, num julgamento da operação Lava Jato de 2018, aquele que é investigado tem o direito de não ser obrigado a depor. Afinal, ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo, podendo ficar calado diante de perguntas que o comprometa. Não comparecer seria um ato legítimo, segundo o STF. E, assim, o Min. Moraes teve que amargar a ausência de Bolsonaro ao depoimento, que realmente não aconteceu por sua ausência.
Para fevereiro, destaco um julgamento no Superior Tribunal de Justiça, que decidiu em favor de uma família que havia roubado uma criança da maternidade há mais de 10 anos. Apesar do ato repugnante daquela família, o fato é que a criança foi gerada por pais em total situação de vulnerabilidade, moradores de rua e usuários de droga e, quando localizados pela Justiça, não demostraram nenhum interesse em ficar com o filho. Diante da excepcionalidade do caso e tendo em vista o princípio do melhor interesse da criança, esta acabou ficando com a família adotiva que, apesar disso, foi obrigada a pagar uma multa por litigância de má-fé.
Já o mês de março se notabilizou pelas explicações que o então Min. da Educação, Milton Ribeiro, teve que dar à sociedade, em razão de áudios vazados que davam conta de um balcão de negócios em seu ministério. No mínimo, a quebra do princípio da impessoalidade, com facilitação de políticas públicas em prol de aliados do Presidente Bolsonaro, era um fato que poderia se extrair daqueles áudios. Mais tarde, em junho, o Ministro acabou preso pela Polícia Federal.
Em abril, aponto a notícia envolvendo o ex-deputado Arthur do Val, o Mamãe Falei, que depois da divulgação de seus famosos áudios sexistas (quem não lembra da frase “são fáceis porque são pobres”), renunciou ao cargo, tendo evitar sua cassação e seus direitos políticos. Entretanto, foi uma manobra que deu errado, pois a legislação sobre o tema, desde 2010, não é mais favorável a políticos pegos em quebras de decoro. Mesmo depois da renúncia, seu caso foi levado a julgamento pelos seus pares e o ex-deputado teve seus direitos políticos suspensos.
Em maio, destaco a notícia do servidor do INSS, pai solo de gêmeos, que teve garantida a licença paternidade pelo STF, em tempo idêntico ao da licença maternidade, de 180 dias, no lugar dos tradicionais 5. Novamente, foi o melhor interesse da criança invocado neste caso.
Já o fim do primeiro semestre, em junho, foi marcado pelo julgamento do Rol Taxativo da Agência Nacional de Saúde Suplementar, que mexeu com os planos de saúde de milhões de brasileiros. Em que pese o STJ ter decidido em favor das Operadoras dos planos, a questão teve uma reviravolta com a aprovação, em setembro, da Lei 14.454, que sepultou o famigerado rol.
Em julho tivemos a PEC Kamikaze. Especialmente em tempos que temos visto os bolsonaristas preocupados com o teto de gastos, essa PEC autorizou que bilhões de novas despesas, em pleno ano eleitoral, fossem realizadas pelo Presidente Bolsonaro, com um pacote diversificado de bondades, todas válidas apenas até o fim deste ano. Um pacote nitidamente com fins eleitoreiros que, conforme a história mostrou depois, não foi suficiente para mudar o resultado das urnas.
Agosto pode ser lembrado pelo julgamento da Nova de Lei da Improbidade no STF, que considerou que o regime mais favorável não beneficia os que já foram condenados pela lei antiga. Somente os casos em andamento podem ter a aplicação da nova lei.
Setembro recebe o destaque do julgamento no STF, que aprovou mais uma tese com repercussão geral, afirmando o que nossa Constituição já diz – que a educação básica é um direito fundamental das crianças e jovens deste país. Especialmente no caso das creches e pré-escolas, os Municípios deverão correr contra o tempo e garantir a cada criança a sua respectiva vaga.
Outubro, o mês da eleição, não teve como passar em branco o já clássico debate dos limites da liberdade de expressão, o papel do Tribunal Superior Eleitoral e o combate às fake news. Críticas podem ser feitas ao trabalho daquela Corte que, em nossa opinião, em alguns momentos acabou passando do ponto, realizando verdadeira censura, reclamação muito comum do Presidente Bolsonaro. Entretanto, é fato que a campanha do Presidente foi a que mais testou o sistema da Justiça Eleitoral, que passou por uma série de ataques e tentativas de descréditos. Para o bem do país, tivemos eleições tranquilas e, em que pese alguns ainda não aceitarem o resultado que saiu das urnas, o fato é que, mais uma vez, nossa democracia saiu fortalecida e teremos nova sucessão presidencial em janeiro de 2023.
Por falar em fake news, em novembro, em nossa coluna, tivemos que esclarecer mais uma que rodou o país que afirmava que o STF havia revogado o direito de propriedade no Brasil. Ao contrário, o que houve, com o julgamento da ADPF n. 828/DF, foi a retomada gradual das reintegrações de posse e ordens de despejo que haviam sido suspensas em alguns casos, durante a pandemia pela COVID-19. Afinal, mandar para a rua, criar uma movimentação de pessoas durante o período de isolamento social não era o mais recomendável. Agora que a questão sanitária está mais controlada, essas ordens judiciais estão sendo retomadas, sob alguns critérios criados por aquela Corte Suprema.
O ano se encerrou com outro julgamento muito importante no STF, envolvendo o chamado Orçamento Secreto, aquelas verbas famosas do relator do Orçamento da União, identificadas pela sigla RP-9. A Corte julgou que esse orçamento é inconstitucional, pois fere os princípios da transparência, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade por serem anônimas, sem identificação do proponente e sem clareza quanto ao destinatário. Somente em 2022, foram movimentados mais de 16 bilhões de reais nesse orçamento desconhecido. A festa, pelo menos quanto a isso, parece ter chegado ao fim.
Como nosso caro ouvinte pôde perceber, o ano de 2022 receberá, por historiadores, diversos adjetivos, menos o de tedioso. Infelizmente, o hexacampeonato na Copa do Mundo não veio. Mas temos aí mais um ano que vai se iniciar em breve e teremos, tanto em nossas vidas individualmente ou em conjunto na sociedade, mais uma oportunidade de escrever um capítulo importante. Que seja de crescimento e de avanços, se Deus assim nos permitir.
Eu sou Alberto Tapeocy, esse foi mais um conteúdo para Coluna “Direitos Fundamentais” da Rádio CBN Amazônia/Rio Branco, toda quinta, a partir das 7h.