A Convenção 158 da OIT: A proteção ampliada nas relações de trabalho
Semana passada se encerrou a votação de um julgamento que se arrastava no STF há mais de 25 anos e que poderia ter alterado bastante as relações de trabalho, especialmente no momento da demissão dos empregados.
Para entender essa história é necessário voltarmos ao ano de 1982, em Genebra, quando foi aprovada a Convenção n. 158 pela Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil faz parte. Essa convenção trata da obrigação dos países darem maior proteção à relação de trabalho, criando mecanismos que dificultam a dispensa dos trabalhadores pelas empresas.
Segundo a convenção, para se demitir um trabalhador, necessariamente o empregador deve dar alguma justificativa, podendo ser relacionada com o desempenho do empregado ou mesmo por questões econômicas da empresa, mas deve dar a ele a oportunidade de se defender previamente, antes de ser dispensado. Com isso, os países signatários devem criar um sistema de indenizações adicionais para que o empregado seja dispensado sem uma motivação.
Na prática, o que essa Convenção criou foi uma espécie de estabilidade no setor privado, diminuindo, com isso, a liberdade das empresas na demissão de seus trabalhadores, tornando mais caro o encerramento da relação de emprego.
Disputa judicial: A validade da denúncia de FHC e a falta de consulta ao Congresso Nacional
Essa Convenção foi aprovada pelo Congresso Nacional apenas 10 anos depois, em 1992, e sendo promulgada em abril de 1996. Entretanto, apenas alguns meses depois, em dezembro de 96, o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, denunciou a Convenção, ou seja, declarou que o Brasil não mais observaria o documento internacional.
A questão foi parar no Judiciário. O STF, então, passou a discutir se a denúncia feita por FHC teria sido válida ou não, porque ele não submeteu a questão ao Congresso Nacional. Ele retirou o Brasil de um acordo internacional sem consultar o Poder Legislativo, que obrigatoriamente participa do processo de internalização desses documentos.
Foram vários os ministros que passaram pela Corte desde então e o julgamento ficou paralisado por diversas vezes durante sucessivos pedidos de vista pelos julgadores. Por isso o julgamento iria completar na semana que vem exatos 26 anos.
Muitos empresários e empresas estavam preocupados com repercussão desse julgamento, que poderia influenciar e muito no poder diretivo do dono do capital à frente de um negócio, encarecendo ainda mais a mão-de-obra nacional.
Impactos da decisão: Como a decisão afeta a demissão dos empregados
Por um placar apertado, de 6×5, o STF acabou por validar a denúncia feita contra a Convenção 158, em que pese ter entendido que as denúncias daqui por diante precisam passar pelo Congresso Nacional. Houve, portanto, uma modulação dos efeitos, porque, em regra, a declaração de inconstitucionalidade retroage à data em a lei ou ato normativo foi aprovado. Neste caso, o Supremo disse que essa obrigatoriedade da análise dessas denúncias pelo Congresso Nacional se dará a partir da publicação da ata desse julgamento, ficando validadas todas as denúncias ocorridas anteriormente.
Resultado final: A manutenção das regras de demissão sem e com justa causa
Resumindo, então, na prática nada mudou, pois as possibilidades de demissão continuam da forma como está em nossa legislação. Por faltas graves, um empregado pode ser demitido com justa causa. E, sem justa causa, os trabalhadores podem ser mandados embora, desde que pagas as indenizações previstas em lei. Não há necessidade, portanto, de motivação ou de oportunizar ao trabalhador uma defesa prévia para ser demitido.
A decisão do STF foi salomônica. Considerar a submissão ao Congresso Nacional das denúncias de tratados e convenções internacionais como sendo uma exigência do sistema de freios e contrapesos de nosso sistema constitucional era algo que já era esperado. Entretanto, o STF evitou alterar o caso específico, após mais de 25 anos de julgamento, pelos impactos jurídicos e financeiros que poderiam ocorrer no setor produtivo brasileiro. Tudo continua como estava, para alívio das empresas, mas decepção dos trabalhadores.
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Direitos Fundamentais
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