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Semana passada, o STF terminou um julgamento extremamente importante, relacionado com um dos temas mais caros para o país: a educação da infância e juventude.

A nossa Suprema Corte aprovou mais uma tese de repercussão geral, ou seja, que deve ser observada pelos Tribunais inferiores, basicamente reafirmando um direito que já consta na Constituição há mais de 30 anos. Que a educação básica é direito fundamental das crianças e dos jovens, assegurada por normas constitucionais de eficácia plena e de aplicabilidade direta e imediata.

O que esse trecho da tese ataca é uma interpretação que por muito tempo foi defendida no meio jurídico no tocante a aplicação das normas constitucionais. Há uma tradição que defende que as promessas que constam no Texto Constitucional, tais como estas que declaram que é direito de todos o direito à educação básica, o direito à saúde, o direito à segurança, seriam declarações e promessas do constituinte, como um programa a nortear os governantes, mas sem uma aplicação imediata e direta.

Para aqueles que defendiam esse tipo de interpretação das normas constitucionais, essas normas eram classificadas como programáticas e deveriam ser concretizadas na medida das possibilidades orçamentárias e financeiras dos poderes públicos. Diante disso, uma demanda judicial, reclamando por uma obrigação de fazer por parte do Estado ou do Município, para oferta de vaga para casos individuais, seria uma impossibilidade. O Estado-Juiz não poderia obrigar o Estado-Administração a criar tais vagas.

Entretanto, esse tipo de interpretação tem sido cada dia mais abandonado, para que as promessas possam deixar o mundo das meras expectativas e se tornem, de fato, em realizações concretas na vida do cidadão. Este é o caso da educação básica. O Poder Público tem, nas palavras do STF, o dever de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica.

O STF foi além. Afirmou, com todas as letras e mirando especialmente nos Municípios, que estes podem ser demandados individualmente, para que uma vaga na creche ou na pré-escola seja garantida.

Houve, durante o julgamento, certo debate sobre a possibilidade de colocarem condicionantes para o exercício desse direito, tais como a comprovação da necessidade econômica dos pais e a comprovação de que foi solicitada a vaga de forma prévia. Mas, essas condicionantes acabaram não ficando no texto final.

Do ponto de vista da jurisdição constitucional, o Texto Magno sai fortalecido, porque a leitura dos direitos sociais e do direito à educação, declarados pela nossa Carta de 1988, é muito direta e sem subterfúgios. Como lembrou o Min. Fux em seu voto-vista, qualquer Portaria ou Instrução Normativa que é baixada pelo Poder Público brasileiro, em qualquer nível de poder, tem imediata aplicação e eficácia. Apenas o texto constitucional estava há mais de 30 anos esperando licença para se tornar realidade na vida das crianças e jovens brasileiros.

Outro fator considerado durante os debates é que a concretização desse direito, além de atender de forma imediata as crianças e jovens, titulares do direito à educação, também atende de forma mediata as mulheres, as mais responsabilizadas na educação dos filhos nos primeiros anos de vida. Garantir uma creche e pré-escola, para que as mulheres possam estar no mercado de trabalho, colabora na diminuição das desigualdades de gênero.

Entretanto, não podemos tampar o sol com a peneira. Não é a mera caneta dos Ministros do Supremo que resolverá os problemas de vagas nas creches e pré-escola Brasil afora. De início, o que deve ocorrer é uma maior judicialização. Uma tese aprovada no STF não é capaz de alterar as limitações orçamentárias e técnicas de um pequeno Município no interior do país.

As teses defensivas da Fazenda Pública, como a ‘reserva do possível’, por vezes, não são meras chicanas criadas por Procuradores em conluio com administradores com má vontade. A total impossibilidade técnica ou orçamentária para mudar a realidade da falta de vagas é uma verdade crua e dura que por vezes se impõe.

Mas, neste caso das vagas das creches, a decisão está dada e o Poder Público precisa correr contra o tempo, um tempo que já lhe foi dado por 30 anos. Caso contrário, as liminares e os milhares de processos virão e o cumprimento da norma será muito mais dolorido.

Alberto Tapeocy, para Coluna “Direitos Fundamentais” da Rádio CBN Amazônia/Rio Branco, toda quinta, a partir das 7h.


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