Desde o ano passado, muito tem se falado sobre as alterações promovidas na Lei de Improbidade Administrativa, que acabaram por tornar mais difícil a responsabilização de gestores ímprobos no Brasil.

Dentre as principais alterações, podemos citar a exigência de dolo, ou seja, da real intenção em praticar o ato de improbidade. Com isso, não é mais possível se condenar um agente que praticou um ato culposo. Atos de improbidade causados por imperícia, imprudência ou negligência não são mais puníveis.

Outra alteração é que somente o Ministério Público pode mover ações de improbidade. Antes, qualquer ente público, prejudicado pelo ato, era parte legítima para demandar contra seus gestores ou ex-gestores. Alteração igualmente sensível está no regime da prescrição. Enquanto, no passado, se contava do fim do mandato do gestor ou da data da apresentação da prestação de contas final, agora são oito anos a partir da ocorrência do fato. Isso vai contra uma teoria muito aceita em termos de contagem de prazos prescricionais no direito brasileiro, em que a contagem do prazo somente se dá quando do efetivo conhecimento da causa de uma demanda (teoria da actio nata).

Pois bem, ontem o STF começou a julgar se essas mudanças mais benéficas para os gestores ímprobos são aplicáveis de forma retroativa, ou seja, se é possível aplicar o novo regime mais benéfico em favor de pessoas já condenadas por ato de improbidade administrativa.

No centro da discussão está o art. 5º, XL, da Constituição Federal que traz a garantia fundamental da retroatividade da lei penal mais benéfica para o réu.

Por essa garantia, se um determinado agente for condenado à pena máxima de um determinado crime, por exemplo, 20 anos de reclusão, mas, no dia seguinte, for aprovada uma lei em que se prevê que a nova pena máxima é de 10 anos ou, melhor ainda, que o ato praticado pelo condenado não é mais considerado crime, o agente será beneficiado imediatamente.

Entretanto, clara como o sol, a norma fundamental afirma que esse tratamento é para a lei penal e não para uma lei de caráter civil como é a Lei de Improbidade Administrativa.

Mas, em Direito, nada é tão óbvio ou fácil. Alguns oradores foram ontem à tribuna do STF para defender que essa norma constitucional não pode ser interpretada de forma literal. Defenderam, ainda, que haveria uma equivalência entre a norma penal e a norma da Lei da Improbidade Administrativa.

Entretanto, a Constituição é direta e seu texto não deveria sofrer interpretações tão largas. Se o constituinte quisesse que uma lei mais benéfica fosse aplicada a todo e qualquer caso, ele o teria feito. Pelo contrário, o texto da Carta Fundamental trata somente da lei penal. Nada mais.

Contudo, não se pode afirmar, com absoluta certeza, qual será o resultado desse julgamento. A jurisdição constitucional, exercida pela Suprema Corte, obviamente não conta somente com a interpretação literal ao seu dispor. Qual será o exercício exegético neste caso, é algo a se acompanhar.

Alberto Tapeocy, escreve para Coluna “Direitos Fundamentais” da Rádio CBN Amazônia/Rio Branco, toda quinta, a partir das 7h.

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