Fotografia: Eddy Van Acekr de Pixabay

Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral para debater a validade da norma que obriga o casamento pela separação obrigatória de bens para aqueles que se casam após completarem 70 anos de idade.

Essa é uma norma do nosso Código Civil que, em tese, serve para a proteção do idoso, para evitar que seja vítima de relacionamentos amorosos movidos unicamente pelo interesse econômico.

Por meio desse regime, os bens que os noivos trazem para dentro do casamento (ou união estável) não se comunicam, formando patrimônios separados. Os cônjuges podem livremente vender seus bens particulares sem precisar da autorização do outro. Quanto aos bens adquiridos na constância do casamento, inicialmente, estes também não formavam um patrimônio único. Cada cônjuge formava seu patrimônio separadamente. É o regime de casamento “o que é meu é meu, o que é teu é teu”.

Entretanto, há muitas décadas, existe uma Súmula do STF, a de número 377, que diminuiu o rigor do regime da separação legal. Para evitar injustiças, em que alguns cônjuges eram privados de trabalhar e, portanto, não formavam patrimônio pessoal, o Supremo decidiu que, quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento, estes se comunicam. O regime passou, portanto, a ser do “o que é meu é meu, o que é teu é teu, o que é nosso é nosso”.

Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça, alguns anos depois, acabou sedimentando o entendimento de que, sim, esse patrimônio adquirido na constância do casamento se comunica, ainda que seja no regime de separação legal de bens, entretanto, precisa haver prova de que houve esforço comum para sua formação. Ou seja, “o que é nosso é nosso, desde que ambos tenham contribuído”.

A principal consequência com a imposição desse regime de separação acontece quando há o fim do casamento, seja pelo divórcio, seja pela morte. No caso do divórcio, há uma necessidade de comprovar que houve o esforço comum do casal para a aquisição do bem. Já no caso de morte, além de ter que provar que ajudou na aquisição dos bens após o casamento, o cônjuge sobrevivente é excluído da sucessão dos bens do seu companheiro. Todo o patrimônio particular do morto, bem como os bens adquiridos que não houver prova do esforço comum, passa para os descendentes.

Se essas regras que expliquei, de forma rápida, são constitucionais ou não é o que o Supremo vai julgar.

A situação no Código Civil de 1916 era ainda mais restritiva. O limite para casar podendo escolher livremente o regime de casamento era de 60 anos para os homens e 50 anos para as mulheres. No código de 2002, houve a unificação do limite etário, ficando em 60 anos para ambos os sexos. Apenas em 2010 é que esse limite foi aumentado, subindo para 70 anos a liberdade que as pessoas têm para escolher o regime patrimonial de seus relacionamentos.

Muito se critica essa norma, porque ela restringe a liberdade do idoso. Se não houver nenhuma prova de que sofre alguma senilidade, em razão do avançar da idade, o idoso tem plena capacidade civil, podendo realizar uma compra e venda, abrir empresa, fazer doações, etc. Com 70 anos, um idoso pode, inclusive, candidatar-se para algum cargo da República. Entretanto, ele fica impedido de eleger seu regime matrimonial.

É uma norma que quer proteger aquele que se considera mais vulnerável. Entretanto, cada dia mais, as pessoas envelhecem com mais saúde e totais condições de se autogovernar. A norma, que será julgada pelo STF, certamente limita a liberdade das pessoas idosas.

Para aqueles preocupados com sua sucessão, até que o STF decida algo, o que pode ser feito para diminuir a gravidade dessa normal legal é buscar os instrumentos voltados para o planejamento patrimonial sucessório. Através de uma doação em vida, um testamento ou, até mesmo, por meio de um sistema de holding familiar, o interessado em resolver a questão da herança em favor da pessoa amada tem ferramentas que podem servir para compensar a exclusão determinada pela lei.

Como afirmou o Min. Barroso, esse julgamento vai afetar a vida de milhares de brasileiros, causando impactos nos regimes patrimonial e sucessório daqueles que têm mais de 70 anos de idade. Vamos acompanhar.

Alberto Tapeocy, para Coluna “Direitos Fundamentais” da Rádio CBN Amazônia/Rio Branco, toda quinta, a partir das 7h.




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